Por muito diferentes que possam ser entre si, as quatro figuras emblemáticas da existência pós-moderna [deambulador (flanêur), vagabundo, turista e jogador], entretecidas e interpenetrando-se, têm em comum o facto de visarem a repartição do processo da existência numa série de episódios (idealmente) auto-suficientes e fechados sobre si próprios, sem passado e sem consequências, sendo o resultado que tendem a resultar as relações humanas fragmentárias e descontínuas — impedem a construção de redes duradouras de deveres e obrigações mútuos. Todas estas figuras apreendem o Outro fundamentalmente como objecto de avaliação, não moral, mas estética; como fonte, não de responsabilidade, mas de sensações. Tendem por conseguinte a eximir uma enorme área das interações humanas, incluindo as mais íntimas, do juízo moral.

—Zygmunt Bauman, A Vida Fragmentada, Relógio D’Água, 2007