Hoje em dia já ninguém lá vai, aquilo está cheio de gente

Artigos da categoria “Livros e Poesia

The Normal

Publicado em 07/12/2021

The key, if you want to build habits that last, is to join a group where the desired behavior is the normal behavior.

—James Clear, Atomic Habits, Avery, 2018

(Isto é uma forma de dizer aquilo que na prática foi a minha educação básica. O terror dos meus pais e dos meus avós sempre foram as companhias. E o pior é que funciona ainda melhor para comportamentos e hábitos indesejados. Parece óbvio, mas está muito longe de o ser para mesmo muita gente.)

Chimpanzés

Publicado em 06/12/2021

Um estudo determinou que quando um chimpanzé descobre uma maneira eficaz de partir nozes enquanto pertence a um grupo e depois muda para outro grupo que tem uma estratégia menos eficaz, evitará usar o método melhor, só para não se evidenciar dos outros chimpanzés.

—James Clear, Hábitos Atómicos, Lua de Papel, 2019 (2018)

Tendem

Publicado em 29/10/2021

Por muito diferentes que possam ser entre si, as quatro figuras emblemáticas da existência pós-moderna [deambulador (flanêur), vagabundo, turista e jogador], entretecidas e interpenetrando-se, têm em comum o facto de visarem a repartição do processo da existência numa série de episódios (idealmente) auto-suficientes e fechados sobre si próprios, sem passado e sem consequências, sendo o resultado que tendem a resultar as relações humanas fragmentárias e descontínuas — impedem a construção de redes duradouras de deveres e obrigações mútuos. Todas estas figuras apreendem o Outro fundamentalmente como objecto de avaliação, não moral, mas estética; como fonte, não de responsabilidade, mas de sensações. Tendem por conseguinte a eximir uma enorme área das interações humanas, incluindo as mais íntimas, do juízo moral.

—Zygmunt Bauman, A Vida Fragmentada, Relógio D’Água, 2007

Potential

Publicado em 24/10/2021

If I were to wish for anything, I should not wish for wealth and power, but for the passionate sense of the potential, for the eye which, ever young and ardent, sees the possible. Pleasure disappoints, possibility never. And what wine is so sparkling, what is so fragant, what so intoxicating, as possibility!

—Søren Kierkegaard, Either/Or Vol. 1, 1959

Realidade

Publicado em 23/10/2021

Sim, passava aqui frequentemente há vinte anos…
Nada está mudado — ou, pelo menos, não dou por isso —
Nesta localidade da cidade…

Há vinte anos!…
O que eu era então! Ora, era outro…
Há vinte anos, e as casas não sabem de nada…

Vinte anos inúteis (e sei lá se o foram!
Sei eu o que é útil ou inútil?)…
Vinte anos perdidos (mas o que seria ganhá-los?)

Tento reconstruir na minha imaginação
Quem eu era e como era quando por aqui passava
Há vinte anos…
Não me lembro, não me posso lembrar.
O outro que aqui passava então,
Se existisse hoje, talvez se lembrasse…
Há tanta personagem de romance que conheço melhor por dentro
Do que esse eu-mesmo que há vinte anos passava aqui!

Sim, o mistério do tempo.
Sim, o não se saber nada,
Sim, o termos todos nascido a bordo.
Sim, sim, tudo isso, ou outra forma de o dizer…

Daquela janela do segundo-andar, ainda idêntica a si mesma,
Debruçava-se então uma rapariga mais velha que eu, mais lembradamente de azul.

Hoje, se calhar, está o quê?
Podemos imaginar tudo do que nada sabemos.
Estou parado física e moralmente: não quero imaginar nada…

Houve um dia em que subi esta rua pensando alegremente no futuro.
Pois Deus dá licença que o que não existe seja fortemente iluminado.
Hoje, descendo esta rua, nem no passado penso alegremente.
Quando muito, nem penso…
Tenho a impressão que as duas figuras se cruzaram na rua, nem então nem agora,
Mas aqui mesmo, sem tempo a perturbar o cruzamento.
Olhámos indiferentemente um para o outro.
E eu o antigo lá subi a rua imaginando um futuro girassol.
E eu o moderno lá desci a rua não imaginando nada.

Talvez isto realmente se desse…
Verdadeiramente se desse…
Sim, carnalmente se desse…

Sim, talvez…

—Fernando Pessoa, Poesias de Álvaro de Campos, 1944