Hoje em dia já ninguém lá vai, aquilo está cheio de gente

Artigos da categoria “Livros e Poesia

Afinal

Publicado em 18/09/2023

— Devia encará-lo mais calmamente. Eu faço questão de nunca me deixar afectar por factores externos. Restrinjo-me à minha escrita e ao meu pensamento. A verdade é bela, a beleza é verdade e por aí afora; afinal de contas, essas são as únicas coisas de valor sólido.

—Aldous Huxley, Contos Reunidos, Felizes para Sempre, Antígona 2014 (1957)

A Alucinação de Ivan Fiódorovitch

Publicado em 12/09/2023

—(…) “Nos nossos dias é reacionário acreditar em Deus”, disse-lhes, “mas eu sou o diabo, de modo que acreditarão em mim.” “De acordo, de acordo”, responderam-me. “Quem não acredita no diabo? Mas não podemos admiti-lo. Seria susceptível de prejudicar a nossa reputação. No entanto, sob a forma de anedota, se quiser…” Mas eu considerei que seria uma anedota pouco engenhosa e não se publicou. E, olha, é uma coisa que ainda hoje me dói. Os meus melhores sentimentos, a gratidão, por exemplo, estão-me proibidos devido à minha posição social.

— Fiódor Dostoiévski, Os Irmãos Karamázov, Saída de Emergência 2018

O que há em mim é sobretudo cansaço

Publicado em 05/05/2023

O que há em mim é sobretudo cansaço
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
Cansaço.

A subtileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos por o suposto alguém.
Essas coisas todas –
Essas e o que faz falta nelas eternamente -;
Tudo isso faz um cansaço,
Este cansaço,
Cansaço.

Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada –
Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque eu quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser…

E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto…
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço.
Íssimo, íssimo. íssimo,
Cansaço…

—Fernando Pessoa, Poesias de Álvaro de Campos, 1944